Por Ricardo Abramovay
A sustentabilidade foi apropriada não só pelo discurso, mas pelas práticas das maiores marcas globais.
Coca-Cola, Nestlé, Procter&Gamble, Unilever, Walmart, McDonald’s, Nike, IBM, Google, Siemens ou General Electric, cada uma delas lançou, nos últimos cinco ou dez anos, ambiciosos programas em que migram para fontes credenciadas de fornecimento, reduzem suas emissões de gases de efeito estufa ou diminuem sua pegada hídrica.
Maquiagem, propaganda enganosa, mudança cosmética? Muitas vezes, certamente sim. Mas é expor-se a riscos incompatíveis com o tamanho desses negócios prometer neutralidade em água, abastecimento vindo de produtores certificados, eliminação de resíduos tóxicos ou transição para energias renováveis e imaginar que o não cumprimento dessas metas possa passar em branco.
Essa constatação suscita, é claro, uma questão crucial: será que a transição das maiores empresas do capitalismo global para o eco-negócio é capaz de interromper as perdas ecossistêmicas a que tem levado o crescimento da economia mundial? Peter Dauvergne e Jane Lister respondem a essa pergunta com um enfático não, em livro recém publicado pela prestigiosa editora do Massachussets Institute of Technology.
Nessa contradição entre o empenho em melhorar o uso dos recursos materiais, energéticos e bióticos e o agravamento da deterioração ambiental talvez resida o maior desafio atual das sociedades humanas. Por que as empresas globais estão fazendo da sustentabilidade um objetivo estratégico? Por que, apesar disso, a destruição continua? Quais os caminhos para enfrentar este impasse?
É claro que a pressão da sociedade civil e a exposição crescente das grandes firmas a riscos reputacionais ajuda a explicar seu envolvimento com temas socioambientais. Dauvergne e Lister, entretanto, chamam a atenção para outros fatores nessa conversão. O fundamental é que o eixo de organização do capitalismo contemporâneo não é mais a fábrica operando num lugar fixo que reúne milhares de pessoas em torno de uma atividade claramente gerenciada e hierarquizada.
Ao contrário, o que predomina hoje são cadeias de valor que funcionam sobre a base de milhares de fornecedores. A Walmart, por exemplo, tem mais de 100 mil fornecedores, dos quais 20 mil só na China. A própria oferta de produtos industriais, que se trate de têxteis, calçados ou eletrônicos, apoia-se numa pulverização de produtores para cuja coordenação o melhor uso da água, da energia, a redução do lixo ou das emissões é indispensável.
Muito bom!