
Outro dia escutei um cozinheiro que reuniu as aves: as galinhas, os gansos, os pavões, os faisões e os patos. E eu escutei um pouco o que o cozinheiro dizia para elas. O cozinheiro perguntava com que molho elas queriam ser comidas. Uma das aves, uma humilde galinha disse: “Nós não queremos ser comidas de maneira nenhuma. O cozinheiro esclareceu: “Isso está fora de questão.”. Eu achei esta reunião muito interessante porque é uma metáfora do mundo. O mundo está organizado de uma forma tal que temos o direito de escolher o molho com que seremos comidos.
Eduardo Galeano
Por Maíra Mendes
Os recentes acontecimentos parecem ter colocado o Brasil numa espécie de novela, ou, mais atualmente, num seriado político que se pode acompanhar ao vivo. A conjuntura parece a alguns ter virado os pólos magnéticos da Terra, deixando atônitos e confusos aqueles se acostumaram a viver um glorioso mar de estabilidade. Como nossa cultura de debate político ainda não sabe conviver com diferença de opinião, muitas vezes o caminho da violência e da mediocridade argumentativa procura esconder uma dificuldade de colocar em suspenso o que se parecia, há tão pouco tempo, sólido.
A grande armadilha política me parece agora o que se entende por democracia. Possivelmente um conjunto significativo desistiram da leitura do título deste texto, pelo simples fato de democracia vir seguida de um ponto de interrogação. Quem ousaria colocar a democracia em dúvida? A democracia precisa ser uma certeza! Não se pode hesitar em defesa da democracia. Com exceção de um punhado de viúvas da ditadura, quem seria contra a democracia?
Aí é começa a dificuldade: para quem sempre teve a justiça ao seu lado, as movimentações de um setor do judiciário são graves. Levantam argumentos que poucos compreendem. Vemos um brandir ensandecido de artigos, parágrafos e incisos constitucionais bradados de eloquentes togas em todos os espectros políticos possíveis. Normalmente falam em presunção de culpa, grampos ilegais, personalismo de juristas, atentado ao Estado Democrático de Direito com letras maiúsculas. Para quem sempre teve a justiça ao seu lado, estamos vivendo o fim dos tempos.
Sinto muito aos amigos juristas, mas das especificidades jurídicas eu não compreendo. Acho que não sou a única. Mas alguma coisa sobre democracia posso me arriscar a dizer, ou ao menos sobre a falta dela.
Acho q a professora não entendeu nada. O q está em questão não é se a corrupção entranhada no sistema político e empresarial nacional deve ser combatida ou não, mas se, a pretexto disso, deve-se destruir o que existe de Estado Democrático de Direito (é com maiúsculas mesmo).
Se a injustiça já chega aos mais pobres e protestamos contra ela, sem o mínimo de garantias constitucionais não poderemos nem reclamar.
Estou mais com os que afirmam que o fascismo não está a caminho, ele já está aí, inclusive nos casos q vc cita, em setores da mídia que incentivam o extermínio de jovens negros a pretexto do combate à criminalidade, em setores políticos, em grande parte incentivados por setores do PSOL, que fazem do discurso de reivindicações corporativistas de policiais um elemento empoderador de uma militância armada a serviço de forças conservadoras, etc.
Barrar o golpe hoje é essencial para defender a frágil democracia que temos, que se não é o suficiente, com certeza é menos dramática do que a alternativa concreta que se apresenta.