Por Mohammad Jamal.
Olhando assim extasiado a luminescência do firmamento, esse céu de um azul profundo apinhado de estrelas cintilantes em imperturbável passividade, fica difícil acreditar que, tendo Deus criado a sua obra maravilhosa e nos entregado ela, a nossa terra, para que a compartilhássemos em paz e, ainda assim, em sua divina magnanimidade criadora, o Ser Supremo tenha escolhido viver e estar compartindo-a entre nós! Tal como algumas cerimônias religiosas o citam: ELE está entre nós! Fico chocado, tamanha a coragem e poder de Deus lhe permitir sobreviver aqui no meio dos seres humanos divididos em tribos antagônicas, os ricos, os pobres, os explorados na miséria e àqueles, vítimas da sequiosa ignomínia e opróbio dos mais fortes e sanguinários, eugênicos em suas metas e princípios. Viver nessa terra transmutada pela maldade humana não é viver, é lutar para sobreviver.
Quando criança, lá pelos meus oito anos, eu tinha uma imagem muito clara de Deus. Ele velhinho, devastado pela idade e envolto em seu miza’ar de lã (xale), tendo a cabeça o Gahfiya branco (touca) encoberta pelo Keffiyeh (turbanteescuro) encimado pelo igal (cordão negro e macio) para fixar o Keffiyeh. Deus tinha rosto sem traços de uma mulher altamente respeitável. Embora ela tivesse uma aparência humana, tinha muito mais em comum com os seres imaginários que povoavam meus sonhos: de modo algum se assemelhava a alguém com quem eu pudesse me deparar nas ruas. Digo isso porque quando ELE apareceu diante dos meus olhos, estava de cabeça para baixo e um pouco inclinado para um lado. Os seres imaginários do meu mundo de fantasia sempre desapareciam constrangidos e envergonhados ao fundo pouco depois que eu os percebia, e foi também assim com ELE. Depois de detalhar em visão panorâmica o mundo real ao meu redor, tal como vi em filmes e fotografias enormes, Sua imagem foi ficando mais nítida e elaborada, Ela ou Ele começava a ascender, esvanecendo à medida que subia para ocupar o lugar que lhe cabia em meio às nuvens no céu.
O Deus das minhas fantasias não exibia o brilho dourado dos metais preciosos nem o cintilar multicor das pedras lapidadas, não tinha pompas ou circunstâncias, não era celebridade, não incutia medo nem disseminava ameaças; também não chegava a ser frio nem indiferente, porque nos fitava com doce firmeza perscrutando no íntimo da nossa alma, os nossos pequenos segredos e inocentes transgressões de criança, com serenidade. Sem esforço, eu via as dobras do seu xale branco que cobria Sua cabeça. As imagens eram tão nítidas quanto as que eu tinha visto em estátuas e ilustrações dos livros de história,ocidentais, e cobriam inteiramente o seu corpo; não se via sequer Seus braços ou pernas.