“aviso aos leitores dessas ideias permitidas que minhas reticências a Moro não implica simpatia pela corrupção; apenas preferência pela justiça em detrimento do justiçamento. A política justicialista emplacada por Moro e o procurador Deltan Dallagnol, desde sempre violou a inviolabilidade do nosso ordenamento constitucional, mesmo que tenha sido apresentada como um movimento cruzadista contra a corrupção, chaga que asfixia nossas esperanças num país mais justo e inclusivo”.
Por Caio Pinheiro.
Bolsonaro é de fato um ser camaleônico. Parece ter lido ao menos parte das lições de como conquistar e manter o poder escritas por Maquiavel. Entrou para o meio político, fez amigos e aliados, mas esqueceu do fundamental: para quem pretende conquistar o poder não é possível prescindir de exercê-lo! Contudo, nesse aspecto faço referências elogiosas ao “mito”, ele nunca disse que iria exercer a “chefia do governo”, queria ser apenas “chefe de estado”, já que jamais abriria mão de mitificar-se reiteradamente. E assim o fez, terceirizou as responsabilidades administrativas do país entre “tchutchucas”, “olavetes” e “capitão nascimento” na sua versão “meu juiz favorito”.
A reminiscência patológica da guerra fria, o ódio às minorias, uma leitura falaciosa das disparidades socioeconômicas, um estrangeirismo subserviente e a simplificação analítica de questões muito complexas, fazem do governo Bolsonaro um campo de terra infértil. Nesse sentido, concordo com Rodrigo Maia, vulgo “fluminense”: o governo Bolsonaro é um deserto de ideais! Na verdade, o correto seria dizer que na ausência de ideias sobram convicções úteis e convenientes, mesmo que não se saiba até quando terão permeabilidade social a julgar pelos últimos levantes populares. .
Se não bastasse, como parte do greem team Bolsonarista, o ex-juiz e agora super-ministro Sergio Moro (até quando não sabemos!) tenta desencalacrar-se da mesma armadilha que usou contra seus adversários-réus. O site The Intercept, seguindo o modus operandi da Lava-Jato, deu ressonância ao que muitos cidadãos e cidadãs insistem em denunciar: há uma trama meticulosamente armada contra os interesses nacionais que, em linhas gerais, efetiva-se com a anuência de frações expressivas do executivo, legislativo, judiciário e grandes veículos de comunicação.
Antes de seguir nessa tese, aviso aos leitores dessas ideias permitidas que minhas reticências a Moro não implica simpatia pela corrupção; apenas preferência pela justiça em detrimento do justiçamento. A política justicialista emplacada por Moro e o procurador Deltan Dallagnol, desde sempre violou a inviolabilidade do nosso ordenamento constitucional, mesmo que tenha sido apresentada como um movimento cruzadista contra a corrupção, chaga que asfixia nossas esperanças num país mais justo e inclusivo.
Contudo, todos esses imbróglios decorrentes da politização da justiça foram capitados pelos holofotes midiáticos em 2016. Logo após o então juiz Sergio Moro, titular da 13ª Vara Criminal de Curitiba, reconhecer a irregularidade no grampo que interceptou a conversa da presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula, indaguei a um amigo também juiz o que ele achava do caso. Para minha surpresa ouvir como resposta: esse cara é louco! Não me dei por satisfeito e voltei a inquiri-lo. Questionei-lhe o motivo de achar um colega de ofício louco. Tive como resposta uma frase seca: o que ele fez é crime! Como a devolutiva foi seca e rapidamente descontextualizada, encerrei meus questionamentos e passei a conversar sobre amenidades.
Insatisfeito, mergulhei na compreensão dos argumentos instados pelo ex-juiz para exercer prerrogativas que não eram suas. Segundo o mesmo, havia determinado a interrupção da intercepção telefônica, por despacho de 19/03/2016, às 11:12:22. O diálogo entre Lula e Dilma havia sido recolhido às 13h32, entretanto o delegado da Polícia Federal Luciano Flores de Lima (responsável pelas investigações) e as operadoras de telefonia foram informados da suspensão dos grampos até as 12h18, mas mesmo assim Moro determinou o levantamento do sigilo de todo processo, inclusive da conversa entre a presidente e o antecessor dela.
Em despacho, Moro argumentou que o levantamento propiciaria “assim não só o exercício da ampla defesa pelos investigados, mas também o saudável escrutínio público sobre a atuação da Administração Pública e da própria Justiça criminal. A democracia em uma sociedade livre exige que os governados saibam o que fazem os governantes, mesmo quando estes buscam agir protegidos pelas sombras”. Para fortalecer seu argumento de que nem mesmo o presidente “tem privilégio absoluto” na proteção de suas conversas, Moro remeteu-se ao caso Us vs Nixon, de 1974, em que a Suprema Corte dos EUA decidiu que o então presidente Richard Nixon não poderia se negar a disponibilizar gravações de conversas na Casa Branca a outros entes do Estado.
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